Artigo

Dimensão missional (parte IV) - Missão da presença

Dentro da compreensão da dimensão missional, a missão da presença tem elevada importância ao completar o papel da Igreja diante da missão de Deus (missĭo Dei) em restaurar toda a criação e criatura.

 

No artigo anterior, na ilustração da via férrea, colocamos a missão do envio como a atuação da Igreja no anúncio das Boas Novas em lugares não alcançados e na plantação de novas Igrejas. Mais à frente, ampliaremos essa compreensão com a atualização de sua melhor descrição como a missão do anúncio, ou do querigma (palavra grega para pregar, anunciar), explicando que todos somos enviados, não apenas missionários ou evangelistas com dons específicos para isso.

 

Prosseguindo ainda dentro do cenário da MISSÃO DA PRESENÇA, lembraremos a essência do artigo anterior, onde busquei afirmar que Deus espera que, como Igreja, estejamos presentes no cotidiano, agindo como cristãos, tomando decisões que levem em conta nossos ideais e valores éticos. Por outro lado, observamos frequentemente pessoas que, ao se converterem, continuam vivendo seu projeto de vida como antes, separando a vida particular/privada/religiosa para os domingos, conectando-se com as coisas do reino de Deus, com a Igreja, com sua devoção e piedade. Entretanto, sua vida pública a partir de segunda-feira segue normalmente como antes e, para alguns, Deus tem uma atuação como uma espécie de “personal guru” para resolver os desafios da vida. Assim, cada um prossegue com um projeto esquizofrênico: vida privada/ religiosa + vida pública.

 

Nesse contexto, a pessoa deixa de ser a tradução, a vitrine das Boas Novas diante do ambiente em que vive. Será que isso não seria um dos principais motivos pelos quais temos perdido o direito de ser ouvidos no mundo, em nosso trabalho, na faculdade, entre os vizinhos? O que temos a dizer e a mostrar ao mundo complexo, vulnerável, instável de hoje a respeito da vida? Apenas que já somos salvos e estamos esperando a vinda de nosso Mestre, que vai resolver finalmente todas as mazelas do mundo?

 

O missiólogo Michael Goheen nos desafia ao afirmar que “a Igreja é um povo enviado ao mundo sete dias por semana como testemunhas do Reino de Deus, em contraste com a Igreja como um povo reunido um dia para adoração e ocupação religiosa”.

 

Sobre este tema, tenho compartilhado uma frase que me foi inspirada pelo missiólogo Ed Stetzer e que é importante repetir aqui: ele disse que “se vivo uma vida missional, vivo uma vida moldada pela missão de Deus”. Isso me levou à conclusão de que, ao viver uma vida missional, estou vivendo uma vida moldada conforme a missão de Deus (missio Dei). A partir de minha conversão, meu projeto de vida se torna o projeto da missio Dei, no qual me entrego como instrumento de Deus em Sua missão de restaurar toda a criação e toda criatura.

 

Então, assim que uma pessoa se converte, “a chave vira”, mudando o rumo de seu projeto de vida. Seus valores, princípios éticos e relacionamentos passam a cumprir a missão de Deus para restaurar toda criação e criatura. Estar “PRESENTES NO MUNDO” significa continuar exercendo sua profissão e papel na sociedade, mas agora com o objetivo central de questionar e responder se sua maneira de viver está alinhada com a missio Dei.

 

Goheen, em seu livro “A igreja missional na Bíblia”, descreve esse processo através de três setas apontando para três direções, que eu expandi com mais detalhes. Veja a seguir:

 

 

Em geral, começamos explicando pela seta número 2, quando alguém aceita o Evangelho. Muitas vezes, levamos a pessoa a considerar que um dia Jesus voltará e que ela deve viver sua vida frequentando as atividades dominicais e se envolvendo com a Igreja. Isso reflete um Evangelho salvacionista e escatológico.

 

Porém, o Evangelho integral nos leva de volta à origem de tudo (seta número 1), onde, com a rebelião no Éden (Gênesis 3), toda a humanidade se afastou de Deus. Assim como é uma nova criação (II Coríntios 5.17), temos o compromisso de nos envolvermos na reconstrução de nosso projeto de vida. Seria como rebobinar uma antiga fita de vídeo, retornando ao início e assumindo nossa origem de vida, o Plano da Criação.

 

Dessa forma, podemos adotar os valores desse Plano da Criação e avançar em direção ao nosso destino projetando nossa PRESENÇA no mundo como tradução das Boas Novas, demonstrando uma vida transformada por meio de um testemunho vivo (seta número 3). Cumprimos nosso papel ao sermos uma comunidade atrativa e de contraste diante de um mundo secularizado, perverso e corrompido (Filipenses 2.15,16), manifestando a vida perdida no Éden e compatível com o Plano da Criação. Essa vida de PRESENÇA no mundo mostrará a “normalidade” da vida planejada por Deus para a humanidade.

 

Portanto, nosso papel PRESENTE no mundo vai além de ganhar nosso sustento diário; somos instrumentos de Deus para que o mundo retorne ao plano original de Deus, por meio da salvação e da conversão.

 

A MISSÃO DA PRESENÇA envolve a participação da Igreja e de cada cristão na vida pública cotidiana, abrangendo um processo amplo que coloca cada membro da Igreja fora do ambiente, de certa forma protetivo, do templo e do ajuntamento de fim de semana, para desempenhar seu papel no mundo, exercendo cidadania, profissão, vida relacional, doméstica, ambiente de amizade e no trânsito.

 

Precisamos aprender a viver como um povo de contracultura em um mundo diferente do plano original de Deus, com uma cosmovisão distante que também precisa passar pelo processo de “conversão”. Aqui, o cristão enfrenta enormes desafios ao compreender tanto a cosmovisão cristã quanto a cosmovisão que governa o ambiente em que vive, sabendo viver e influenciar como sal e luz neste ambiente.

 

Isso traz grandes desafios para a Igreja, exigindo que cada membro seja preparado para ter sua vida transformada de dentro para fora, com valores que guiam suas decisões, ações, relacionamentos e projeto de vida, para que, PRESENTE NO MUNDO, seja luz, ilumine, salgue e dê sabor ao ambiente em que vive, conquistando o direito de ser ouvido.

 

No próximo artigo, avançaremos mais nesse caminho.

 

Lourenço Stelio Rega

 
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